quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Black Blocs e o apego aos símbolos

Pedro Correia, estudante e militante da UJC-RJ

Enquanto milhares decidiram ir para as ruas levantar suas causas de luta em cartazes, gritos, palavras de ordem e discursos, outros decidiram ir para as ruas levar tudo isso condensado em um símbolo: a ação direta violenta. Não é de hoje que é possível perceber a dificuldade da articulação entre setores populares e o Estado, esta que fica resumida ao pedido do voto e na confiança que, elegendo o representante x ou y será possível a mudança. Enquanto políticos se apresentam como representantes e salvadores, alguns grupos se apresentam como defensores do povo. Mas salvar de quê, e defender do quê?

Podemos observar por detrás das notícias dos grandes meios de comunicação que o mundo não vai bem. Apesar do luxo difundido nas novelas grande parte da população ainda vive em condições miseráveis, sem acesso aos meios de consumo necessários para manter uma vida digna. Além disso, moradores de favela tem de conviver diariamente ora com a opressão do tráfico, ora com a opressão policial, isso quando não acontece pior, e estas duas se condensam em modelos de pacificação belicistas.

O grande foco das manifestações da atual conjuntura brasileira é o Rio de Janeiro. Jogos Olímpicos e Copa do Mundo são um bom pretexto. Existe algo como o esporte para reunir todas as classes em torno de um único objetivo? Acho que não. O problema de tudo isso começou quando uma classe tentou se apropriar de um dos poucos patrimônios que transcendem – ou pelo menos harmonizam - a luta de classes, que é o esporte. Privatizaram o Maracanã, expulsaram os índios que viviam ao entorno do estádio, sumiram com o Amarildo, removeram favelas, realizaram chacinas, e, como a cereja do bolo, a polícia bateu 'com vontade' nos manifestantes que decidiram se manifestar mostrando o quanto essa história estava errada para a maioria.

A violência policial foi a gota d'água para a consolidação de um grupo de jovens que desejam mudar o sistema e acabar com essa injustiça pregada pela minoria. A polícia é o símbolo e o punho do Estado. É a frente armada e bélica do Estado burguês e entrará em ação logo que esse Estado vê seus interesses ameaçados. Como no filme “A Batalha de Seattle(2007)” é claro que o Estado é que ordena as forças polícias de atacarem, como o governador Sérgio Cabral no Rio de Janeiro. Mas analisando mais a fundo o contexto, também se vê que por trás da ordem do Estado de atacar os manifestantes, também existe uma pressão dos empresários e representantes que compõe no filme o encontro da Organização Mundial do Comércio para que o evento não seja adiado devido aos combates entre policiais e manifestantes nas ruas de Seattle. A violência policial foi retratada no filme de forma brutal, assim como a vista presencialmente por muitos nas ruas do Rio de Janeiro. Porém por trás dessa violência policial estava o Estado, e, por conseguinte, os interesses da OMC. Vemos por trás da violência policial um interesse de classe, brutal, feroz, inverossímil, onde os interesses comerciais da Organização Mundial do Comércio se sobrepõe ao interesse popular das ruas, a ponto de escolherem reprimir duramente a população ao invés de tentar soluções diplomáticas ou pacíficas.

É injusto, e, logo, a violência contrária é legítima. Mas agora que tipo de violência em autodefesa será construída e o que estará por trás dessa violência? No caso das forças policiais há o Estado, os interesses comerciais e a burguesia. E no caso dos Black Blocs? Quem está por trás dessa violência? Não deve se desvalorizar o uso da violência do oprimido, argumento justo que os Black Blocs usam para legitimar suas ações. Mas se um grupo nasce espontaneamente, se dizendo representar o povo e sendo “a defesa do povo”, isso parece ressoar os discursos dos políticos em época de eleição. Organicamente e objetivamente eles não são a defesa do povo, pois o povo não está organizado em entidades que possam exercer o Poder Popular, o único poder que pode substituir o poder corrupto vigente e representante dos interesses comerciais da burguesia. Logo, os Black Blocs comportam-se como os políticos em época de eleição. Prometem defender-nos e lutar por nós, mas até quando isso irá durar é uma dúvida. Parte da população apoia a iniciativa, assim como estariam votando em um candidato, na esperança de que alguém os represente enquanto continuam sentados vendo suas TV, navegando no Facebook e jogando seus Video Games.

E aí se em algum momento falta aos grupos de ação direta as bases do Poder Popular, a solução não será culpar uns e outros por passividade e dizer que a conjuntura é muito difícil para criar Poder Popular, como diriam os políticos profissionais. Alguns combatentes ficarão comovidos e tentarão jogar o jogo institucional após a “iluminação”, outros se manterão fiel a luta e ficarão taxados como loucos ou se tornarão lendas, mas muitos, assim espero em meu otimismo, tentarão criar o Poder Popular. Apenas este garantirá que os Black Blocs não sejam apenas um símbolo vazio, uma manifestação de violência evasiva. A polícia continuará viva mesmo após os protestos, prontas para atacar, e treinando para isso, com o dinheiro da burguesia. E os Black Blocs? Sou otimista e não desvalorizo a iniciativa, não tenho fetiche com a propriedade privada. Só não é possível confiar integralmente a ação direta violenta sem bases sociais.